quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Teatro universitário Ouro Verde:


A ministra da Cultura, Ana de Hollanda, recebeu nesta quinta-feira, 16/2, em Brasília, o deputado federal Alex Canziani (PR) e a reitora da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Nádina Moreno, com o objetivo de buscar formas de parcerias para a reconstrução do Teatro Universitário Ouro Verde, atingido por um incêndio de grandes proporções na tarde do último domingo, 12 de fevereiro.
“Temos que nos preocupar com esse teatro, nos juntarmos ao governo estadual e à iniciativa privada, através da Lei Rouanet, e encontrar mecanismos para reconstruir esse importante espaço cultural, referência para todo estado do Paraná e para o Brasil”, disse a ministra.
O deputado federal Alex Canziani e a reitora Nádina Moreno se mostraram entusiasmados após o encontro e confiantes no processo de parceria e reconstrução do teatro. “A ministra se mostrou consternada com a situação, e informou que desde segunda-feira acompanha as notícias referentes ao incêndio e à destruição do teatro. Isso nos faz crer que o Ministério da Cultura será um grande parceiro para que esse importante espaço seja devolvido à população de Londrina e do Brasil. Agora, o primeiro passo é levantarmos com exatidão os custos da reforma, para elaborarmos um projeto de reconstrução”, afirmou o deputado Alex Canziani.
“Pela importância histórica e cultural, pelo prédio projetado pelo arquiteto João Batista Villanova Artigas, importante figura do modernismo brasileiro, nós vamos trabalhar juntos para recuperar esse importante patrimônio brasileiro”, afirmou a ministra Ana.
Teatro Ouro Verde após o incêndio
60 anos de história
Inaugurado em 24 de dezembro de 1952,  quando Londrina vivia o auge da cultura do café, o então Cine Teatro Ouro Verde foi adquirido pela UEL em 1978 e, desde a década de 1980, abriga as mostras do Festival Internacional de Londrina (FILO). Em 1998, a edificação foi tombada pelo Patrimônio Histórico e Cultural do Paraná. O teatro é o maior do norte do Paraná.
Atualmente, o espaço que apresenta capacidade para 853 espectadores, está em processo de tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), razão pela qual a ministra Ana solicitará ao Instituto que realize um estudo detalhado dos custos do processo de restauro do teatro.
No último domingo, o prédio foi atingido por um incêndio que consumiu toda a parte interna do edifício, onde ficavam o palco e as poltronas. A assessoria da UEL informou que foi possível salvar apenas alguns objetos, como dois pianos, que estavam em uma sala na frente, e alguns arquivos nos fundos do edifício. O teatro estava fechado desde o fim de dezembro, por conta da reforma no palco de 120 metros quadrados, que teve todo o piso de madeira trocado. Foram investidos no ano passado cerca de R$ 2 milhões nos sistemas hidráulico, elétrico e em equipamentos. Sua reabertura estava prevista para ocorrer no dia 10 de março, dando início às comemorações dos 60 anos de sua inauguração.
(Texto: Marcos Agostinho – Ascom/MinC)
(Fotos: Letícia Verdi – Ascom/MinC e divulgação UEL)

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Pela reconstrução do Ouro Verde:





Campanha da rede Massa à favor da reconstrução do Ouro Verde:



Naquele palco pisaram Kazuo, Geraldine, Fafá, violinos, corais de vozes consonantes, dissonantes, histórias mil. O cine-teatro Ouro Verde, obra de importância histórica fundamental para a cidade de Londrina e para o norte do Paraná, teve grande parte de sua estrutura reduzida a pó com o recente incêndio: sua reconstrução é necessária!

O título da campanha que a rede massa - redistribuidora do sinal do SBT para a região de Londrina e norte do estado, em geral - promove: "Teatro Ouro Verde: quero ver de novo!": faz ecoar a voz daqueles que, ligados ou não ao ramo das artes, compreendem o valor cultural de inestimável importância que o edifício mantém, e, portanto, clamam juntos pela reconstrução do teatro. A referência ao pássaro mitológico é um clichê perdoável porque quase que inevitável: o Ouro Verde deverá luzir de novo, como antes, mais do que antes, e, para tal, não podemos ficar calados.

Essa mensagem destina-se não só àqueles que habitam a bela Londrina, mas também à todos aqueles que já passaram pela terra dos pés vermelhos e aprenderam a amar aquele lugar. São nomes como Kazuo Ono, Geraldine Chaplin, Fafá de Belém, Renato Borghi, Mário Bortolotto, Paulo Leminski, Eugenio Barba, e tantos outros conhecidos artistas da cena teatral brasileira e internacional; mas também de gente como Thales Maciel Maniezzo, Eidglas Danilo Xavier, o Borracha, a Pâmela Nogueira, Andresa Paola, a Katiane Negrão, o Paul Lazar, a Suzana Chagas, Ricardo Paglia, Gerrah Tenfuss, Robson Fabrini, Meire Valin, Andrea Yamada, Camila Lins Franca, Lucas Iglesias, Lucas Godoy, Érika Cezário de Toledo, Andressa Francelino, Fabíola Gonçalves, Fabíola Antico, Raoni Carricondo, Rafael Garcia, Laura Geraldo Marafante, Liza Menzl, Nayara Gobbis, Afonso Júnior, Karina Barbieri, Renata Santana, Natália Viveiros, Roger Valença, Janaína Ribeiro, Camila Luiza, a Dayana Fonseca, a Camila Fontes, o Luiz Valcazaras, e tantas e tantas outras pessoas que, talvez, o "grande público" não reconhecerá, mas que não são menos importantes nessa história. São Adriane Gomes, Heloísa Helena Bauab, Thais D´Abronzo, Aguinaldo Moreira, Camilo Scandolara, Fernando Stratico, Sandra Parra Furlanete, Janete El Haouli, Mário Loureiro, Heloísa Castelo Branco, Mauro Rodrigues, Fátima Carneiro, Ceres Vittori - professores do departamento de música e teatro da UEL - é Nitis Jacon, é Paulo Bráz, e todos aqueles anônimos que já compartilharam daquele espaço para assistirem e serem assistidos. A lista não caberia em um livro, e eu só disponho de um pequeno post de blog...

Encerro pedindo desculpas pelo talvez piegas romantismo. É que eu também me sinto parte daquele espaço. Como estudante da Universidade Estadual de Londrina, por diversas vezes pisei naquele chão, sentei-me naquelas poltronas e assisti a espetáculos vários. Com o incêndio do Ouro Verde, incendiado foi um pouco de cada um de nós: a fumaça subia aos céus e transformava a história em dióxido de carbono.

Pois que renasça. Deve renascer. Precisa renascer. Reconstruir o Ouro Verde é manter o patrimônio cultural de Londrina vivo, garantir que essa riqueza simbólica inestimável que o teatro constitui vença as forças contrárias e, assim, não permita que uma importante parte de cada um de nós se reduza às cinzas sem mais.



E se você, como eu, acompanha os fatos distante da saudosa Londrina, pelos meios de comunicação e redes sociais, então eu o convido a compartilhar essa ideia. Divulgue também mensagens de apoio e motivação para incentivar todos os envolvidos nessa luta em prol do Ouro Verde!


domingo, 5 de fevereiro de 2012

Sócrates diante da morte:




Porque morrer é uma ou outra destas duas coisas: ou o morto não tem absolutamente nenhuma existência, nenhuma consciência do que quer que seja, ou, como se diz, a morte é precisamente uma mudança de existência e, para a alma, uma migração deste lugar para um outro. Se, de fato, não há sensação alguma, mas é como um sono, a morte seria um aravilhoso presente. Creio que, se alguém escolhesse a noite na qual tivesse dormido sem ter nenhum sonho, e comparasse essa noite às outras noites e dias de sua vida e tivesse de dizer quantos dias e noites na sua vida havia vivido melhor, e mais docemente do que naquela noite, creio que não somente qualquer indivíduo mas até um grande rei acharia fácil escolher a esse respeito, lamentando todos os outros dias e noites. Assim, se a morte é isso, eu por mim a considero um presente, porquanto, desse modo, todo o tempo se resume a uma única noite.

Se, ao contrário, a morte é como uma passagem deste para outro lugar, e, se é verdade o que se diz que lá se encontram todos os mortos, qual o bem que poderia existir, ó juízes, maior do que este? Porque, se chegarmos ao Hades, libertando-nos destes que se vangloriam serem juízes, havemos de encontrar os verdadeiros juízes, os quais nos diria que fazem justiça acolá: Monos e Radamante, Éaco e Triptolemo, e tantos outros Deuses e semideuses que foram justos na vida; seria então essa viagem uma viagem de se
fazer pouco caso? Que preço não serieis capazes de pagar, para conversar com Orfeu, Museu, Hesíodo e Homero? Quero morrer muitas vezes, se isso é verdade, pois para mim especialmente a conversação acolá seria maravilhosa quando eu encontrasse Palamedes e Ajax Telamônio, e qualquer um dos antigos, mortos por injusto julgamento. E não seria sem deleite, me parece, confrontar o meu com os seus casos e, o que é melhor, passar o tempo examinando e confrontando os de lá com os de cá, os últimos dos quais tem a pretensão de conhecer a sabedoria dos outros, e acreditam ser sábios sem o ser. A que preço, ó juízes, não se consentiria em examinar aquele que guiou o grande exército a Tróia, Ulisses, Sísifo, ou os incontáveis outros? Isso constituiria inefável felicidade. Com certeza aqueles de lá são mais felizes do que os de cá, mesmo porque, são imortais, se é que o que se diz é verdade. 

Platão, apologia de Sócrates


Sugestão de leitura:

PLATÃO. Apologia de Sócrates
_______. Fedon

É sobretudo nas duas obras acima indicadas que Sócrates, professor de Platão, disserta com maior profundidade sobre o problema da morte. No primeiro caso, o pensador ateniense se encontra diante daqueles que decidiram seu destino: impuseram-lhe a pena capital, a qual Sócrates - pelo menos segundo Platão - encara com coragem. Esse sentimento ambíguo que afeta o filósofo ante seus momentos finais tem um que de ansiedade e fascínio, receio e anseio. Não obstante, é por conta da filosofia que o velho sábio não perde sua capacidade de refletir sobre as grandes questões da vida, sobretudo essa, nosso destino comum. Para Sócrates, uma vida não analisada não mereceria ser vivida. Essa análise, que se dá por meio da filosofia, serviria de preparação para a morte. Em Fédon, Sócrates, encarcerado, ante seus minutos finais, discorre sobre o mistério do além túmulo e afirma a fé numa vida póstuma, numa outra dimensão. Resistiria, portanto, a alma. 

Seja como for, Sócrates resiste como estímulo, como uma fotografia de seu período atualizada pela história, e segundo já foi dito, toda a história da filosofia é uma nota de rodapé em Platão. Se é, e de fato é, dado que a a filosofia ocidental tem seu berço com os gregos, então toda a história da filosofia é um comentário sobre Platão e sobre seu mestre, Sócrates, que, esteja onde estiver, aqui e agora, na leitura deste texto, estará.






Ah, você tá interessado na morte desse Sócrates:


Então clique aqui.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Grotowski e o multiculturalismo:


 Cada vez que os alicerces começarem a tremer sob seus pés, cada vez que não estiver seguro da estabilidade de suas experiências passadas, regresse às suas origens.

- Grotowski -



É por isso que a ideia mesma do multiculturalismo - ainda que importante como princípio de respeito à complexidade plural das culturas várias que constituem aquele ente anônimo que chamamos à título de simplificação de "humanidade" - pode servir a objetivos outros, à vilania de oligarquias que querem exercer o poder sobre uma massa acéfala e desencantada do que lhes confere caráter e unidade: a cultura.


Sugiro a leitura da obra de Stuar Hall, culturalista jamaicano que, em seu livro "A identidade cultural na pós-modernidade", percebe que vivemos um estado de coisas em que a cultura se torna desenraizada, ela atravessa identidades antes geograficamente estabelecidas para se determinar como topos global. Sobretudo a internet possibilita esse trânsito e dilui qualquer nexo local pelas conexões com identidades simulacro, informação em abundância. Mas informação, formação, conhecimento e sabedoria, e, ainda Sabedoria, são coisas diferentes. A crise da pós-modernidade tem uma raíz na epstemologia de Kant, que por sua vez tem um pé em Descartes: o penso, logo existo, motivou um espírito idealista que acaba por diluir qualquer ideia de "verdade" num relativismo que chega ao absurdo: o significado vazio, dado que o significante, aquilo que é objeto de significação, não é, em suma, nada em si (a coisa em si é incognoscível, dizia Kant, que Peirce adorava). Quanto aos valores morais, súbito se transformam em construções culturais e, assim, relativos. O que resta como valor absoluto é o metal, que só não é mais vil do que quem dele faz uso.

Hoje em dia eu discordo de alguns pontos em Grotowski, sobretudo quando propõe o teatro como um ritual laico que substitua o ritual religioso, mas ele foi, sem sombra de dúvidas, um grande pensador e realizador em sua arte.

A anti-catarse do absurdo:




Em poucas palavras, direi ainda, em relação aos trágicos, que não faziam por sabedoria aquilo que faziam, mas por certa natural inclinação e intuição, como os adivinhos e os vates; e embora digam muitas e belas coisas, não sabem nada daquilo dizem. O mesmo parece acontecer com os outros poetas; e também me recordo que eles, por causa de suas poesias, acreditavam-se homens sapientíssimos ainda em outras coisas, nas quais não eram. Por essa razão, então andei pensando que nisso eu os superava, pela mesma razão que superava os políticos.

Platão, Apologia de Sócrates

A nota socrática sobre os poetas trágicos nos aponta para um nome em particular, que, nesse contexto, sobressai sobre os demais tragediógrafos e comediógrafos gregos: Aristófanes. Foi ele quem aproveitou-se da peça As nuvens para tecer comentários críticos sobre a pessoa de Sócrates, tido pelos partidários da democracia como corruptor da juventude, dado que dava força mesmo a mais débil lógica. Para um moderno, Sócrates pode ser descrito como filósofo irônico, e seus diálogos com os sofistas só fazem revelar o gênio de um sábio que tinha em sua dúvida a pedra de toque de sua sapiência: só sei que nada sei: sua máxima mais famosa, ao lado do "conhece-te a ti mesmo". Mas o "conhece-te a ti mesmo" socrático é um conhecer-se a si mesmo pela relação com os outros, o que implica em conflito. 

Quando Platão lança sua crítica ao caráter corruptor da mímese, no décimo livro da República, parece ecoar princípios que saltam das páginas de seus diálogos, e que traçam algumas pinceladas sugestivas sobre essa  figura tão importante para a cultura ocidental. O conhece-te a ti mesmo socrático é um conhecer-se a si mesmo pela e através da relação com o outro, o que implica em conflito, instala a tensão: entramos, assim, no campo do drama: ação. Condenados ao agir, somos nós atores de nossa própria existência, concordo com Sartre - ao que pese não rebelar-me contra a metafísica como fez o filósofo francês. Curiosamente ele, Sartre, também se dedicou à dramaturgia. Curiosamente, Platão escrevia como quem redige uma peça teatral: são diálogos cheios de imagens impactantes, conflitos, tensão. Talvez Aristóteles tenha razão: aprendemos pela imitação: a tragédia tem uma função pedagógica, a saber, a de expor num âmbito ficcional a tragédia humana de forma artística.

Hoje, para muito além da sociedade do espetáculo, a tragédia se transforma em farsa, e o teatro do caos, realidade cotidiana que nos fere, serve de anestesia contra o efeito catártico que a tragédia proporcionaria, e, assim, o drama perde sua função pedagógica. São signos que remetem a outros signos, que fazem menção a outros signos de outros signos, e nessa dança todo significado se esvai. Perdidos num niilismo, a vida mesma se transforma em significante vazio, absurdo cotidiano que nem Beckett poderia prever.